quinta-feira, 3 de março de 2011

USP demite professor por plágio em pesquisa

Chefe de trabalho que usou imagens sem creditá-las, ele diz não ter havido má-fé
É a 1ª exoneração do tipo em 15 anos; comissão conclui que ex-reitora, coautora, não teve relação com problema

A reitoria da USP decidiu demitir um professor de dedicação exclusiva, com mais de 15 anos de carreira, após entender que ele liderou pesquisa que plagiou trabalhos de outros pesquisadores.
A exoneração por plágio é a primeira na instituição em mais de 15 anos. O imbróglio envolveu também a ex-reitora Suely Vilela, coautora da pesquisa questionada. Ela não sofreu punição -a avaliação é que não teve relação com os trechos plagiados.
Outra pesquisadora teve o título de doutorado cassado. Era responsável pelas partes contestadas. Tanto o docente quanto a pesquisadora podem recorrer internamente e judicialmente das decisões.
"A punição de docente, discente ou funcionário técnico-administrativo é sempre dolorosa", disse à Folha o reitor João Grandino Rodas, a quem coube a decisão da punição, após duas comissões internas terem recomendado a decisão. O processo durou mais de um ano.


"Contudo, há de se ter em mente que em casos gravíssimos, como os presentes, a ausência do devido castigo compromete a universidade, cujo maior tesouro é a credibilidade", completou.
O docente Andreimar Soares, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto, foi demitido por ser o principal autor da pesquisa, que copiou imagens de trabalhos de 2003 e 2006, sem creditá-las aos autores, da UFRJ (Federal do Rio).
Um dos objetivos do trabalho da USP era investigar se uma substância isolada da jararaca é útil contra o vírus da dengue. Dez cientistas participaram da pesquisa, publicada pela revista "Biochemical Pharmacology".
As imagens copiadas eram de responsabilidade de Carolina Dalaqua Sant'Ana. O trabalho foi uma continuação de sua tese para doutoramento na USP. A escola decidiu cassar o título por entender que houve plágio e "possível fraude" em seu trabalho.
A publicação em revistas científicas é um dos principais indicadores de produção no mundo científico. Uma boa produtividade rende prestígio e financiamentos.
RETRATAÇÃO
A Folha ligou anteontem para a casa do docente demitido. Uma mulher informou que ele não daria entrevista. A reportagem tentou por mais de um mês contato por e-mail, sem sucesso.
Em mensagem anterior, ele afirmou que "ocorreu um lamentável erro de substituição de figuras pela minha ex-aluna de doutorado". Soares disse, porém, que não houve má-fé e que já havia tomado medidas para a retratação "deste grave erro".
A reportagem não encontrou a pesquisadora que perdeu o título de doutora. Segundo a reitoria, ambos foram ouvidos no processo, ao qual a Folha não teve acesso.
A investigação começou em 2009, após a denúncia do próprio grupo da UFRJ, autor das imagens copiadas.
O último caso de demissão na USP por plágio foi em 1995, envolvendo docente do Instituto de Psicologia. Nos últimos anos, surgiram ao menos outras duas denúncias, nas área da física e do direito. Ambas não acarretaram em exoneração.
Para reitor da USP, pena terá "efeito pedagógico"
João Grandino Rodas afirma ter acolhido conclusões de comissão
"A USP ganha, por mostrar seriedade, não hesitando em "cortar a própria carne", quando imprescindível", diz ele
DE SÃO PAULO
O reitor da USP, João Grandino Rodas, afirmou que as punições terão "efeito pedagógico" na universidade. Após a conclusão das sindicâncias, ele diz que ocorrerão, nos fóruns da USP, discussões sobre ética e propriedade intelectual. Abaixo, as respostas enviadas por e-mail na noite de anteontem. (FT)
Folha - Por que a punição? João Grandino Rodas - A comissão processante concluiu que as imagens do artigo publicado em 2008, em que o professor é o último autor e autor correspondente, já faziam parte de artigos publicados em 2003 e 2006, sendo que não houve referência.
No caso da aluna, a comissão concluiu pela evidência clara de plágio e possível fraude na tese, que justificam a cassação do título de doutor. Acolhi as conclusões.
A USP perde com o caso?
A punição de docente, discente ou funcionário técnico-administrativo é sempre dolorosa. Contudo, em casos gravíssimos como os presentes, a ausência do devido castigo compromete a universidade, cujo maior tesouro é a credibilidade, e os milhares de uspianos que primam pela honestidade intelectual.
A pena serve como punição ao infrator, com efeito pedagógico aos demais. A USP ganha, por mostrar seriedade, não hesitando em "cortar a própria carne", quando imprescindível.
Deverá haver críticas em relação à punição...
Não se pode confundir repressão com poder disciplinar. Este faz parte do Poder Público, em todos os sistemas jurídicos do mundo.
O regimento da USP, da mesma forma que entidades similares, está investido do poder disciplinar, que se enquadra no Estado de Direito


FÁBIO TAKAHASHI
DE SÃO PAULO

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