quinta-feira, 3 de março de 2011

Recife tem ilhas de calor comprovadas por satélite

Por Otávio Batista

É comum ouvir pelas ruas: “Nunca senti tanto calor” ou “Recife nunca esteve tão quente”. A dissertação “Variação espacial e multitemporal das temperaturas da superfície da cidade do Recife”, defendida por Elvis Bergue Moreira no Programa de Pós-Graduação em Geografia (PPGEO) da UFPE, confirma que a cidade passa por um processo de aquecimento. Mais do que isso, a pesquisa identifica a variação de temperatura em espaços reduzidos na mesma região, podendo, assim, verificar a formação de ilhas de calor. O estudo aponta a urbanização desordenada como principal causa para o aquecimento dessas regiões. É em áreas como a Zona Sul da cidade, onde se localizam os bairros de Boa Viagem e da Imbiribeira, caracterizados por um intenso processo de urbanização, onde estão localizadas estas ilhas de calor. 

Essa diferença de leituras em uma mesma região é possível através da técnica de sensoriamento remoto para temperaturas de superfícies. O método consiste em um processo de calibração radiométrica de uma imagem de satélite por um software. Desse modo, uma imagem do Recife feita pelo satélite Landsat 5 TM, no dia 27 de agosto de 2007, passou pelo software ERDAS Imagine 9.3 (licença do Departamento de Ciências Geográficas da Universidade Federal de Pernambuco-UFPE). O percurso da imagem bruta até o resultado final com a leitura das temperaturas da superfície consiste em média de nove equações. A metodologia utilizada permitiu uma análise de áreas com a precisão de 30m². Além disso, foi feita uma comparação com outra imagem, de 10 de julho de 1984, que, segundo o pesquisador, é um registro histórico. Isso permitiu a observação da evolução do processo de urbanização e sua consequência no aumento dos índices de temperatura da superfície.

VARIAÇÃO – De acordo com Moreira, as ilhas de calor se caracterizam por regiões que apresentam temperaturas superiores a localidades vizinhas. Diversos fatores podem influir para sua formação como a localização, umidade, topografia e urbanização. “Geralmente, ambientes extremamente urbanizados, com grandes coberturas de concreto, e intensa circulação de veículos são propícios para a formação de ilhas de calor”, esclarece o pesquisador. Foram identificadas ilhas de calor no centro comercial do Recife, no bairro de Boa Viagem e da Imbiribeira. “Para se ter uma idéia, em Boa Viagem, você sai do Manguezal do Pina, que é uma ilha de amenidade, e poucos metros depois está no estacionamento do Shopping Recife e a temperatura chega a variar 8ºC”, observa. Ilhas de amenidade, em contrapartida, são as regiões que apresentam as menores temperaturas de superfície, geralmente áreas de cobertura vegetal ou corpos hídricos. 

Segundo o pesquisador, materiais como concreto, asfalto e zinco, típicos de regiões de intensa urbanização, são bons condutores térmicos. Isso explica o papel de destaque da interferência humana na formação das ilhas de calor. “A cobertura vegetal forma sombras impedindo que a radiação solar incida diretamente no solo, ao mesmo tempo também utiliza essa energia no processo de fotossíntese e não a transforma em calor, mas libera através da evapotranspiração”, elucida Moreira.

Esse efeito fica claro pela comparação das imagens de julho de 1984 com a de agosto de 2007. Nesse período de 23 anos, a temperatura média da superfície subiu 22,2ºC para 27ºC. A urbanização não planejada pela qual a cidade passou no período é apontada pelo pesquisador como principal causa para o aumento. Na comparação das imagens, é possível observar uma intensa substituição de áreas verdes e descampadas por aglomerações imobiliárias, por exemplo. 

FORMAÇÃO – Segundo o geógrafo, a formação de ilhas de calor é um fenômeno que tem influência direta no cotidiano. O aumento da temperatura da superfície, logicamente, mexe também com a nossa sensação térmica de calor. Principalmente à noite, uma vez que a energia térmica armazenada nos materiais condutores é liberada de maneira gradativa. Para amenizar a situação só mesmo apostando no verde, garante Moreira, que defende a implantação de novos parques urbanos e mais áreas arborizadas como uma maneira de controlar o problema.  A técnica de construção da cobertura fresca é outra forma.

Segundo o geógrafo, a alternativa ao calor está em edifícios que possuem jardins e coberturas vegetais variadas no seu topo. O artifício, apesar de viável, é dispendioso, de acordo com Moreira. O autor cita uma iniciativa que vem da Califórnia, nos Estados Unidos, onde vigora uma lei que garante incentivo fiscal ao cidadão que plantar uma árvore na sua propriedade, tendo como objetivo a amenização da temperatura. 

Elvis Bergue Moreira é especialista em clima urbano. Além de ter se dedicado a este tema no mestrado em Geografia, ele manteve seu interesse no doutorado, também no PPGEO da UFPE, onde continua estudando a temperatura da superfície pela técnica do sensoriamento remoto. “No doutorado, em vez de duas imagens, estarei analisando dez imagens. Poderei ter uma situação muito mais detalhada da formação das ilhas de calor e sua intensidade”, adianta. O pesquisador pretende comprovar a hipótese de que a principal causa para o aquecimento observado nas grandes cidades é a interferência humana na superfície.

 

Atualmente Evis é orientado pelo Prof. Ranyére Nóbrega e Profa. Josicleda Galvíncio. Faz parte dos grupos de pesquisa Tropoclima e Sergeo.

Elviz Moreira
elvisberg@hotmail.com

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